Equipe Platinum
21 de mar. de 2023
se juros começarem a cair em agosto, diz estrategista-chefe da XP
João Sorima Neto e Renato Andrade - O Globo
Mesmo contrariando a expectativa do mercado, que esperava uma sinalização mais clara de queda de juros na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), a XP avalia que o Banco Central deve iniciar o ciclo de baixa da Selic em agosto, já que o cenário econômico atual no Brasil é favorável - a atividade econômica é resiliente e há uma contínua desinflação. A queda de juros pode desencadear um movimento de valorização da Bolsa, que já está em 120 mil pontos, prevê a gestora.
A XP estima que a Selic cairá 0,25 ponto percentual em agosto, e mais 1,5 ponto até o fim de 2023, fechando o ano em 12%. O estrategista-chefe da XP, Fernando Ferreira, avalia que, se as taxas juros futuros mais longas recuarem para o patamar histórico de 4% (considerando juros reais), o principal indicador do mercado de ações pode fechar o ano no patamar de 150 mil pontos.
O Globo: Qual a sua avaliação sobre o início do ciclo de queda de juros?
Fernando Ferreira: Nossa expectativa é de um corte de 0,25 pontos percentuais em agosto. As condições para cortar estão aparecendo e eles (o BC) vão preparar o terreno. Temos um mapa com os principais indicadores econômicos e, há seis meses, todos estavam em vermelho. Atualmente, só o desemprego está vermelho. Os demais como câmbio, inflação corrente, expectativa de inflação, situação dos reservatórios, tudo melhorou. Todos estão no azul.
O Globo: E o impacto dessa queda no mercado de ações é imediato?
Fernando Ferreira: Tivemos uma discussão se a Bolsa já não precificou esse primeiro corte de juros. Olhamos para os dados históricos, desde o ano 2000. Foram seis ciclos de cortes de juros. Nesses seis ciclos, se uma pessoa tivesse comprado Ibovespa no mês em que o BC inicia o corte e ficado até até o final do ciclo, a Bolsa rendeu 47% nesse período. E o CDI, no mesmo período, na média, deu 18%. A Bolsa subiu quase três vezes mais que o CDI. Fomos olhar quanto a Bolsa tinha subido antes do primeiro corte e a média foi de 17%, nos seis meses anteriores. Agora, a Bolsa já subiu 20%. Então, na nossa visão, o cenário mais otimista ainda nem começou.
O Globo: Por quê?
Fernando Ferreira: Ainda vemos as pessoas físicas completamente fora de Bolsa e sacando de fundos de ações e de multimercados.A migração que as pessoas fizeram para a renda fixa ainda não voltou. Os fundos multimercados estavam super pessimistas como Brasil, com o arcabouço fiscal. Vários gestores avaliavam mal a nova regra. E eles não pegaram essa alta recente da Bolsa.
Os fundos de pensão estão com a menor alocação em renda variável historicamente. No momento em que os juros começarem a cair, os fundos de pensão tendem a voltar para Bolsa. E o investidor estrangeiro, que no ano passado, trouxe R$ 100 bilhões para o Brasil, está errático este ano. Entra e sai e, no ano, o saldo é positivo em apenas R$ 9 bilhões.
Ou seja, o fluxo dos estrangeiros ainda nem começou. E agora vemos um otimismo do estrangeiro em relação ao Brasil, em parte porque está barato, em parte porque estão otimistas com commodities. E também por falta de opção no mundo.
O Globo: O Ibovespa já chegou a 119 mil pontos, mesmo antes da queda de juros. Qual é a expectativa da XP para o índice?
Fernando Ferreira: Nossa estimativa é de 130 mil pontos para o fim do ano como valor justo. Mas fizemos uma conta, que caso os juros longos continuem caindo, estamos falando do juro real, das NTN-Bs, que estavam em 6,5%, caíram para 5,5%, mas a média histórica é 4%. Se voltarmos para 4%, o Ibovespa pode atingir os 150 mil pontos ao fim deste ano.
O Globo: Quais ações já estão refletindo essa melhora da economia e uma possível queda dos juros?
Fernando Ferreira: Os setores mais sensíveis à queda de juros, os mais óbvios. Imobiliário, varejo, saúde e educação e transportes. As small caps também se beneficiam. Mas, quando a gente olha para Bolsa, setores como bancos, commodities e elétricas também estão muito baratos. A Vale caiu 25% este ano. Só a Vale foi detratrora em quase 4 mil pontos no Ibovespa pelo seu peso. O Ibovespa poderia estar em 124 mil pontos se a Vale estivesse no zero a zero. Ou seja, tem potencial de valorização para todos os gostos.
Até as estatais estão indo bem. O mercado entrou o ano preocupado com a retórica do governo. Os papéis estão desvalorizados no maior nível desde 2008. A gente vê que o governo tem dificuldade de mudança nas companhias, até por uma série de travas que foram colocadas, está havendo uma descompressão no prêmio de risco.
O Globo: Esse discurso do governo, de reversão da privatização da Eletrobras, críticas ao BC, não pode atrapalhar essa recuperação?
Fernando Ferreira: Vai depender muito mais das ações do governo do que do discurso. No governo anterior, foi a mesma coisa. Os discursos, às vezes, assustavam o mercado, mas as ações do governo não iam na mesma linha do discurso. O mercado avalia o que de fato está sendo feito. Institucionalmente, várias amarras foram colocadas desde 2015.
O Globo: E qual é a expectativa da XP para o ritmo de queda de juros?
Fernando Ferreira: Esperamos que a Selic termine o ano em 12%. Para o ano que vem, avaliamos que encerre em 11%. O mercado já foi além disso e, pela curva de juros, a Selic está em 9,3% ao final de 2024. Se o Federal Reserve cortar juros, ajuda.
O Globo: Quais são os riscos para essa trajetória de queda?
Fernando Ferreira: O risco depende da trajetória de inflação. Há risco de a inflação cair e voltar a subir. O quadro fiscal ainda não está claro se o governo vai conseguir os R$ 100 bilhões a R$ 150 bilhões para fechar as contas.